Comunicado
10 notas sobre a Lei n.º 38/2018 e o pedido de fiscalização sucessiva ao Tribunal Constitucional dos artigos que combatem a discriminação nas escolas
20 julho 2019
Lisboa, 20 de julho de 2019
No seguimento da notícia de que 85 deputados e deputadas do PSD e CDS apresentaram esta semana ao Tribunal Constitucional um pedido de fiscalização dos números 1 e 3 do artigo 12º da Lei n.º 38/2018 de 7 de agosto, as associações abaixo subscritas apresentam os seguintes posicionamentos e notas clarificadoras:
1. De acordo com a Constituição da República Portuguesa, a todas as pessoas são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, à dignidade da pessoa humana, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação;
2. A Lei n.º 38/2018 de 7 de agosto, que determina o Direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa, foi Promulgada pelo Presidente da República a 31 de julho de 2018;
3. A Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, veio colmatar lacunas gravíssimas na proteção das pessoas trans, incluindo pessoas adultas e jovens, até então discriminadas pelo facto de a lei não reconhecer o direito à autodeterminação da sua identidade na simples mudança de sexo legal no registo civil, subjugando-as à avaliação de terceiros e a processos que violavam a sua capacidade civil e o seu direito à proteção legal;
4. A Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto veio também proteger as características sexuais de bebés e crianças intersexo, até então subjugadas à mutilação genital à nascença através de práticas medicamente não necessárias que não consideravam o seu direito à proteção da integridade dos seus corpos;
5. A Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, inclui vários artigos com medidas de proteção que proíbem a discriminação na Saúde e na Educação e Ensino, áreas com legislação escassa e pouco clarificadora em matéria de igualdade e de Direitos Humanos e que, por isso mesmo, também foram reforçadas na Estratégia Nacional para a Igualdade e Não Discriminação 2018-2030 - em particular através do objetivo estratégico 3 do Plano de Ação para o combate à discriminação em razão da orientação sexual, identidade e expressão de género, e características sexuais;
6. Os deputados e deputadas em causa questionam as seguintes medidas na lei:
a) Medidas de prevenção e de combate contra a discriminação em função da identidade de género, expressão de género e das características sexuais;
b) Mecanismos de deteção e intervenção sobre situações de risco que coloquem em perigo o saudável desenvolvimento de crianças e jovens que manifestem uma identidade de género ou expressão de género que não se identifica com o sexo atribuído à nascença;
c) Condições para uma proteção adequada da identidade de género, expressão de género e das características sexuais, contra todas as formas de exclusão social e violência dentro do contexto escolar, assegurando o respeito pela autonomia, privacidade e autodeterminação das crianças e jovens que realizem transições sociais de identidade e expressão de género;
d) Formação adequada dirigida a docentes e demais profissionais do sistema educativo no âmbito de questões relacionadas com a problemática da identidade de género, expressão de género e da diversidade das características sexuais de crianças e jovens, tendo em vista a sua inclusão como processo de integração socioeducativa.
7. Os deputados e deputadas signatários deste pedido de revisão pretendem impedir o combate à discriminação, fechar os olhos ao bullying e à violência escolar – aliás, reportados pelo recente Estudo Nacional Sobre o Ambiente Escolar e o Observatório da Educação LGBT – pretendem ainda limitar o desenvolvimento psicossexual e identitário das e dos cidadãos e travar a garantia dos Direitos Humanos das pessoas LGBTI, continuadamente ameaçados por movimentos que propagam o ódio e o medo e que continuam a empurrar as pessoas para o silêncio e para a invisibilidade;
8. Estas associações continuarão a trabalhar diariamente para proteger as pessoas trans e intersexo aos níveis legal, social e de saúde – independentemente da sua idade, condição social ou ideologia político-partidária – e a criar pontes de diálogo entre o poder político e a sociedade civil para garantir que Portugal continue a trabalhar ativamente por um desígnio de igualdade que, claramente, se encontra ainda ameaçado;
9. Lamentamos profundamente a ação destas deputadas e deputados que procuram criar entraves à implementação de medidas governamentais, democraticamente aprovadas por uma maioria parlamentar. Consideramos que as medidas de proteção contidas na Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, são de implementação urgente dada a difícil realidade escolar que muitas crianças e jovens vivem quotidianamente na qual escasseiam tomadas de posição claras, assim como recursos e capacitação de profissionais que facilitem a prossecução da formação para a inclusão, a igualdade e o combate à discriminação. Congratulamo-nos pelo trabalho incansável de tantos concidadãos e concidadãs que nas comunidades escolares procuram ativamente incluir estas alunas e alunos em risco, risco este que se tende a agravar em razão de atitudes como as destas e destes deputados que usam as suas convicções preconceituosas contra o bem-estar desta população infantil e jovem;
10. As associações abaixo subscritas celebram a aprovação da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, e anseiam pela sua aplicação prática que esperam que seja consubstanciada em medidas concretas que tornem a vida escolar menos penosa para as crianças e jovens LGBTI.
As subscritoras:
Associação AMPLOS
Associação Casa Qui
Associação ILGA Portugal
Associação Plano i
Associação rede ex aequo
Associação TransMissão